Fundação Renova

Propriedades rurais atingidas recebem ações integradas de reparação

Publicado em: 05/07/2019

Localizadas no epicentro do desastre, as propriedades passam por readequações socioeconômicas com práticas de conservação ambiental

 

Propriedades rurais atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, localizadas entre Mariana e a Usina Hidrelétrica Risoleta Neves (Candonga), no município de Rio Doce, podem se transformar em unidades produtivas com manejo sustentável. Com o engajamento e a conscientização das famílias, a frente de Uso Sustentável da Terra (UST) da Fundação Renova desenvolve ações em 235 propriedades para garantir a retomada de suas atividades a partir de práticas de conservação ambiental.

Entre os objetivos estão a ampliação e difusão de experiências agroecológicas, diversificação da produção, gestão da propriedade, manejo racional da produção agropecuária e a conservação de recursos naturais, como solo e água. Protagonistas nesse processo, os produtores participam da adoção de tecnologias de baixa emissão ou captura de carbono, melhoria de segurança alimentar e incremento, com o apoio dos órgãos reguladores, de serviços ambientais em áreas produtivas ou de conservação.

As propriedades estão localizadas nos primeiros 113 km da barragem que se rompeu, nas zonas rurais de Mariana, Barra Longa, Ponte Nova, Santa Cruz do Escalvado e Rio Doce, próximas às calhas dos rios Gualaxo do Norte e Carmo. Os rejeitos afetaram currais, pastos, chiqueiros, plantios agrícolas,Áreas de Preservação Permanente(APPs) e fragmentos florestais. As primeiras ações pós-rompimento envolveram a limpeza das calhas e estabilização das margens dos rios Gualaxo do Norte e do Carmo. Foi feita a revegetação emergencial de 808 hectares com espécies de crescimento rápido, a reconformação dos rios principais e a recuperação de 113 afluentes.

 

Mas, para que a restauração das áreas afetadas pelos rejeitos seja efetiva e perene, a readequação ambiental e produtiva das propriedades rurais próximas às margens dos rios deverá ser feita em 2.600 hectares, ou seja, uma área quatro vezes maior que os locais com depósito de rejeitos. “Quando a lama atingiu APPs, o proprietário perdeu área fértil. Ele utilizava esses locais devido à grande concentração de matéria orgânica. Dentro dessa realidade, entra a importância da retomada integrada da propriedade rural. O desafio é oferecer soluções produtivas para compensar as áreas de proteção que ele deixará de explorar”, afirma Lucas Scarascia, líder de Programas Socioambientais da Fundação Renova.

Para mapeamento e embasamento das ações, são aplicadas pela Fundação Renova as mesmas ferramentas que subsidiam políticas públicas.Uma delas é a avaliação feita pelo Zoneamento Ambiental Produtivo (ZAP), que disponibiliza uma base de dados e informações para o aprimoramento da gestão ambiental em bacias hidrográficas. O ZAP ajuda a fazer uma análise das propriedades em sua totalidade.Ainda são examinados, a cada dois anos,os Indicadores de Sustentabilidade em Agroecossistemas (ISAs), composto por um conjunto de 21 indicadores, entre eles fertilidade do solo, gerenciamento de resíduos, diversificação da paisagem e vegetação nativa.

São atribuídas notas para cada indicador de cada propriedade, que variam de 0 a 1. A última média geral obtida das propriedades foi 0,48. O objetivo é atingir 0,7 em 100% das propriedades. Os índices relacionados à conservação das áreas ambientais e problemas de gestão foram os que mais influenciaram no resultado. “Por isso, as ações de recuperação ambiental e capacitação vão ajudar a aumentar este índice para a retomada das atividades agropecuárias”, reforça Scarascia.

Todas essas informações são base para o Plano de Adequação Socioeconômica e Ambiental das Propriedades Rurais (Pasea), aplicado pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado Minas Gerais (Emater-MG).Os eixos que norteiam o Pasea são produção sustentável, infraestrutura rural, agregação de valor, gestão e monitoramento.

 

Balanço

Até o momento,foram implantadas 248 barraginhas (açudes para captação de água pluvial), 10 hectares de piquetes para manejo sustentável do gado, benfeitorias como galinheiros e currais, reparação dos sistemas de irrigação danificados e assistência técnica continuada com foco no manejo de água da propriedade. Para manejo do solo, em alguns casos, foram realizados cercamentos, correção do solo, adubação e plantio.

 

Para incentivar a melhoria genética pecuária e aumento da produtividade, foram inseminadas 939 matrizes, que resultaram em 472 prenhezes e 225 nascimentos.O programa Renova Rebanho alia a tecnologia da inseminação artificial com técnicas de manejo. Foram realizados 170 atendimentos. Os produtores escolhem as raças – são disponibilizados sêmen de gado holandês, girolando, gir e jersey.

 

 

Foram recuperados quase 100 hectares fora da área do rejeito.Cerca de 254 hectares estão em manutenção. Está prevista a recuperação de 594 hectares de áreas produtivas impactadas (pastagens e plantios agrícolas), 47 hortas e 76 pomares.

 

Waldir Pollack foi um dos produtores que aderiram ao plano de readequação agrícola. Sua propriedade está localizada na zona rural de Mariana, em Paracatu de Baixo. Com 20 anos de experiência no plantio de horta orgânica, ele propaga os benefícios de uma alimentação saudável, livre de agrotóxicos.

Com o rompimento, o agricultor sofreu perdas financeiras e percebe a recuperação depois de muito trabalho e dedicação. Hoje, a produção chega a 1.200 pés por semana de cerca de 50 variedades de hortaliças e legumes, entre elas, alfaces, rúcula, couve, cenoura, todas comercializadas em feiras de Mariana.

Como medida reparatória foi construído um alojamento dentro da propriedade para receber alunos da Escola Família Agrícola Paulo Freire, do município de Acaiaca. Pollack atua como monitor e, desde antes do rompimento, reunia os estudantes em sua fazenda. A casa de mel, atingida pelos rejeitos, foi reconstruída. Mas, para a reparação socioeconômica e ambiental dentro do Pasea, foram necessárias benfeitorias como chiqueiro, galinheiro e curral, que complementam as ações de adequação socioeconômica e ambiental da propriedade.

Considerando a aptidão para difusão de boas práticas, a propriedade se tornará Unidade Demonstrativa de Sistemas Agroflorestais com o acompanhamento do Icrafe de Café Orgânico com a Epamig.

 

De acordo com Scarascia, o plano de retomada concilia os objetivos dos negócios com a transformação de áreas degradadas em locais produtivos, com o apoio direto às famílias na gestão e comercialização dos produtos.  “O arranjo proposto para compor a frente de trabalho considera a participação social, difusão de tecnologias e maximização do benefício na ponta, ou seja, direto para o produtor rural e as organizações que apoiam e continuarão apoiando a bacia do Rio Doce.”

Todas as ações reparatórias do programa de Uso Sustentável da Terra da Fundação Renova têm previsão de término para 2021, com assistência técnica e extensão rural (Ater) até 2023 e monitoramento de áreas de restauração florestal até 2026.

 

Regulamentação e sustentabilidade

A Fundação Renova incentiva a adesão aos programas de assistência ao desenvolvimento de projetos, como a Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater), regimentada no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Este mês,210 produtores de Mariana, Barra Longa, Santa Cruz do Escalvado, Ponte Nova e Rio Doce passarão a receber assistência técnica de uma instituição local selecionada por meio de edital.

 

Desde 2017,como medida compensatória, estão sendo feitas a promoção e o apoio no Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro nacional obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades. Ao todo, foram feitos 229 CARs. Também em respeito às normas do código florestal brasileiro, é realizado o Programa de Regularização Ambiental (PRA).

 

Propriedades modelo

Em parceria com o WRI Brasil, Centro Internacional de Pesquisa Agroflorestal (ICRAF) e Fazenda Ecológica, 21 propriedades participam do projeto Renovando Paisagens. A iniciativa desenvolve  25 unidades demonstrativas de produção sustentável dentro de áreas atingidas com total alinhamento com a frente de trabalho do Pasea.  Os modelos vão servir de referência para outras  235 propriedades.

 

Quinze desses modelos serão voltados para Manejo de Pastagem Ecológica, devido ao predomínio leiteiro da bacia do rio Doce. Além de sustentável, o deslocamento do bovino aumenta a produtividade do pasto, recupera áreas atingidas e otimiza o espaço para implantação de sistemas agroflorestais, ajudando a mudar a realidade das fazendas da região em respeito ao meio ambiente.

Outra frente é a implantação de cinco sistemas agroflorestais (SAFs). O método favorece a integração de árvores na paisagem agrícola e de espécies cultivadas em ambientes florestais com alto potencial de contribuição para restauração ecológica e manutenção de funções ecossistêmicas, o que fortalece os meios de vida de agricultores.

Devido ao caráter multiplicador de conhecimento, uma das propriedades que participam do projeto  é a de Waldir Pollack. Foram plantados inicialmente, dentro de uma área de 300 metros quadrados, várias espécies frutíferas, entre elas jabuticaba, banana, jenipapo, acerola e copaíba. Para ele, a SAF vai abrir caminho para que mais produtores da região aprendam sobre esse tipo de plantação. “Ela exige mais atenção na parte técnica e, por isso, os agricultores deve passar a valorizar a produção orgânica e terão mais uma opção de renda”, diz Scarascia.

Outras cinco propriedades serão destinadas à silvicultura de espécies nativas, com cultivo de plantas arbóreas de finalidade comercial, geração de produtos madeireiros ou não-madeireiros.Esse método visa à integração de árvores na paisagem agrícola e de espécies cultivadas em ambientes florestais com alto potencial de contribuir para a restauração ecológica e manutenção de funções ecossistêmicas, o que fortalece os meios de vida de agricultores.

Todos os modelos atuam no desenho, implantação, manejo e na multiplicação dos métodos. Assim, é possível a diversificação econômica, ganho de escala e difusão da tecnologia e o aumento da preservação das áreas.

 

Medidas reparatórias

Com a participação ativa do produtor rural e apoio de técnicos agrícolas, ambientais, agropecuários e florestais, está previsto, como medida reparatória, o plantio de1,5 milhão de mudas de espécies da Mata Atlântica às margens dos rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce. Serão 664 hectares recuperados até 2020.

 

Até o momento, foram restaurados 164 hectares no território do Alto Rio Doce. Desses, 79 hectares estão dentro da área impactada do rejeito.A taxa de sobrevivência foi de 83% nos primeiros hectares plantados. A técnica evita erosão na margem do rio, o que dificulta a descida dos rejeitos à água e minimiza a turbidez, além de ter função paisagística e estrutural. Também contribui para o retorno da biodiversidade.

As mudas são produzidas por viveiristas da bacia do rio Doce.A medida fomenta a economia local e cria conexões entre especialistas, fornecedores e produtores rurais.

Desde 2018, o plantio de espécies nativas conta com o acompanhamento técnico-científico do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa (UFV), que desenvolve metodologias de plantio convencional e condução da regeneração natural por meio de técnicas alternativas de restauração.

 

Sobre a Fundação Renova

A Fundação Renova é uma entidade de direito privado, sem fins lucrativos, constituída com o exclusivo propósito de gerir e executar, com autonomia técnica, administrativa e financeira, os programas e ações de reparação e compensação socioeconômica e socioambiental para recuperar, remediar e reparar os impactos gerados a partir do rompimento da Barragem de Fundão, com transparência, legitimidade e senso de urgência.

A Fundação foi estabelecida por meio de um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), assinado entre Samarco, suas acionistas Vale e BHP, os governos federal e dos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, além de uma série de autarquias, fundações e institutos (como Ibama, Instituto Chico Mendes, Agência Nacional de Águas, Instituto Estadual de Florestas, Funai, Secretarias de Meio Ambiente, dentre outros), em março de 2016.


Compartilhar: